
Muitos proprietários descobrem frequentemente que o registo do seu imóvel no Cadastro contém erros, especialmente no que diz respeito à superfície do imóvel. Este não é um problema trivial, pois um excedente na área registada aumentará o valor cadastral, afetando impostos como o Imposto Predial (IBI) e o imposto municipal sobre mais valias. A retificação desses erros é essencial, não só para evitar cobranças tributárias indevidas, mas também para receber o reembolso dos pagamentos indevidos. José María Salcedo, sócio-gerente da Salcedo Tax Contencioso, explica como obter uma possível restituição de rendimentos indevidos.
Procedimentos para correção de erros na superfície cadastral do imóvel
Existem dois procedimentos principais para resolver esses erros:
Correção de discrepâncias: é regulada pelo artigo 18.º do Texto Revisto da Lei do Cadastro Imobiliário (TRLCI) e corrige erros relacionados com dados ou características específicas do imóvel, incluindo a superfície, mas quando o erro resulta da aplicação incorreta de um norma jurídica (terraços, alpendres, etc.), e não pela medição em si. No entanto, não se aplica a discrepâncias nos parâmetros urbanos ou nas tabelas de taxas avaliativas.
Retificação de erros: é regulada pelo artigo 220.º da Lei Geral Tributária (LTG) e corrige erros decorrentes da aplicação indevida de informação urbanística ou de erros na medição da superfície.
O Cadastro prefere o procedimento de correção de discrepâncias. Porquê?? O Cadastro e as Finanças geralmente preferem a correção de discrepâncias à retificação de erros. A resolução de discrepâncias produz efeitos a partir da data de resolução ou do termo do prazo para reclamações, enquanto a correção de erros produz efeitos retroativos a partir da data do erro.
O Tribunal Central Económico-Administrativo (TEAC) é favorável às finanças. Especificamente, uma resolução recente de 26 de setembro de 2023 (00/01822/2021) apoia o procedimento de correção de discrepâncias para corrigir erros na superfície cadastral. De acordo com suas resoluções, o procedimento de retificação de erros não seria aplicável nestes casos, pois implicaria modificar substancialmente o ato administrativo.
Especificamente, a Corte considera que “não existem as circunstâncias necessárias para a correção dos erros, uma vez que se busca a modificação da superfície construída, os usos e valores levados em consideração, todos os quais exigem a interpretação das normas jurídicas e técnicas, bem como a os títulos considerados, implicando também alteração substancial do ato administrativo”. Todos os itens acima referem-se a uma resolução anterior de 19-1-2016.
Além disso, considera inadequada a utilização do procedimento de retificação de erros porque considera, referindo-se a uma decisão do TSJ da Catalunha de 12-04-2015, que "a retificação de erros não pode ser utilizada quando a intenção é revogar o agir ou alterar o seu conteúdo essencial ou alguns dos seus extremos ou elementos substanciais, pelo que a alteração do registo cadastral de um imóvel, ou seja, o nome do proprietário ou a superfície do imóvel, não pode ser considerada uma mera retificação de um erro factual que pode ser corrigido pelo procedimento de retificação de erros, pois é, pelo contrário, elemento essencial da descrição do imóvel cadastral, conhecendo o seu verdadeiro proprietário, bem como a sua superfície, pelo menos do ponto de vista cadastral”.
Efeito retroativo e restituição de rendimentos indevidos
“O problema de exigir que os contribuintes utilizem o procedimento de retificação de discrepâncias para corrigir erros de superfície na avaliação cadastral é que se pretende que a resolução emitida não tenha efeitos retroativos”, afirma Salcedo. Qual é a consequência? Os contribuintes poderão futuramente fazer poupanças fiscais, tanto na cota do IBI, como numa eventual venda do imóvel no imposto municipal sobre mais valias. No entanto, como nos lembra o sócio-gerente da Salcedo Tax Contencioso, não conseguirão recuperar o que foi pago a maior em anos anteriores. As Finanças preferem abster-se de medidas retroativas após detetar um valor cadastral errado porque a superfície do imóvel no Cadastro era maior que a real.
Em resumo, a correção de discrepâncias não é retroativa, o que limita a possibilidade de solicitar reembolso retroativo de impostos pagos em excesso. No entanto, o Supremo Tribunal tem apontado em vários acórdãos que podem ser obtidos reembolsos de anos anteriores caso o erro tenha existido nesses períodos.
Para José María Salcedo, com as decisões do Supremo Tribunal em mãos, seria possível obter o reembolso dos anos anteriores à correção das discrepâncias. Isto enquanto o erro de superfície existisse durante os exercícios fiscais para os quais é reclamada a restituição de rendimentos indevidos por o imposto ter sido pago segundo um valor cadastral superior ao que corresponderia de acordo com a superfície real do imóvel.
Via rápida para reembolsos de receitas indevidas
O Supremo Tribunal está atualmente a decidir sobre um recurso de cassação para determinar se – o reembolso do pagamento indevido pode ser solicitado diretamente ao reduzir o valor cadastral, corrigindo discrepâncias. Isto poderia simplificar significativamente o processo de reembolso sem a necessidade de iniciar procedimentos especiais de revisão.
Por Despacho de 8 de Fevereiro deste ano (recurso n.º 5519/2022), o Supremo Tribunal decidiu decidir se “nos casos em que o valor cadastral de um imóvel seja reduzido que afecte a liquidação definitiva do Imposto Predial (IBI), determinar se o reembolso de rendimentos indevidos decorrentes do acima podem ser solicitados diretamente, sem requerer, no que diz respeito às liquidações, procedimento de revisão conforme previsto no artigo 221.3 da GLT, tudo baseado no disposto no artigo 224.1, parágrafo 3º da GLT”.
Para concluir, os erros de superfície cadastral devem ser corrigidos para evitar cargas fiscais indevidas. Embora os procedimentos possam ser complexos, o conhecimento das opções disponíveis e das possíveis alterações regulamentares facilitará aos contribuintes a correção destas discrepâncias e a obtenção de reembolsos de rendimentos indevidos.